As estruturas mudam.

Empilhar um andar sobre um andar, lentamente, a arquitetura de um prédio se faz, e assim, como que por mágica, pequenas luzinhas já se podem espreitar ao longo das janelas. Um morador faz café, o outro, rega as suas plantas, através deste céu translúcido neblinoso, nós bem podemos ver os nossos vizinhos de alma que brotavam nos andares conforme o guindaste os colocava ali. De andar em andar, o guindaste os removia do chão, e os suspendia e os colocava ali encima, os pedaços de construção. As pessoas brotavam, como novamente, que por mágica, ali dentro. Os rapazes e moças da biologia antiga bem poderiam dizer, que a geração espontânea dos humanos se dava quando se tinham apartamentos pra eles.
Lembro de uma fala conhecida, um apartamento é um apertamento, e outra, de que cada um vive em sua caixa de sapato, e pelo fio da lembrança, me lembro ali; 'imbarueri na língua do índio; é o lugar onde o amor bebe água, onde a felicidade amarra o sapato, imbarueri, é do lado do lugar comum' , e as pessoinhas dos prédios sentem no ar a pequena harmonia deste meu canto, e a minha memória já vai para outros lábios, de quando me perguntavam o que as pessoas nas outras janelas viviam, e para outros olhos, quando o meu tio deitava os olhos além da janela, com os joelhos encostados na parede a imaginar a vida alheia, são várias pequenas fotografias. Minha lembrança me leva de novo para sonhos que eu tinha, geralmente, havia um terremoto ou um tornado ou uma inundação e os prédios todos estavam destroçados, pequeninos, salvo um milagre, o meu havia se destruído mas minha morada conseguia aterrisar no chão com delicadeza o suficiente para eu sobreviver, e esta é uma preocupação minha, em necessidade de pulo do alto do prédio, qual a posição que devo assumir no pulo, pra que quando eu chegue lá embaixo, eu me destroce mas eu fique vivo? E eu possa preservar a minha vida? Me lembro dos cartuns onde se tinham bombeiros com longos pula pulas, a salvar às pessoas, e me lembro dos japoneses que colocaram grades elásticas ao redor dos prédios para que os moradores fossem mal sucedidos em suas tentativas de acertar o chão com o corpo e caíssem nelas macias. De repente, os moradores estão distantes a só ouvir o meu monólogo, agora, eles transformados em vaga-lumes no ar, vêm me visitar como se meus olhos não soubessem a distância inicial, e saíram de seus compartimentos. Da caixa de sapato, vieram voando em pequenos sapatos, pra amarrar essa felicidade. As nuvens neblinosas que estavam na metade do caminho, começam a brilhar em um ritmo bonito, como luzes de natal, e os vagalumes furam a delicadeza da nuvem entrando na minha janela. O canto deles chegou no meu canto. Os vagalumes me arrodeiam e entram dentro de mim. Agora já é tarde para qualquer ação, penso, e reajo tragando-os, a história viva de cada um dos concidadãos. Pessoas brotam como plantas no meio do nada. Prédios também. Como as praias e as montanhas. Somos macróbios no nome, mas quando olho, somos também micróbios, como um vagalume, a brilhar no andar entre as gravidades e forças de planetas e galáxias. Vagar. Vagar com luz. Quis com este texto, falar sobre a espontaneidade e edição, e sobre a ansiedade e também a espontaneidade. Hora por me render a um pensamento ansioso, já se vai uma frase, e toda uma linha de caminho já construída. Não trilhar por ali não é uma opção, visto que é uma construção caminhada e com uma direção apontada, mas trilhar por ali como uma rota também não é meu inteiro destino. Como ficar preso nas palavras em que se fala, e superjustificar o caminho. O vagalume vaga com sua luz, hora apagado, hora brilhante. Parecia para mim que quando se apaga, deixa de existir. Ou que quando brilha, está apenas ali porque é luz. Então, eis, que nasceu. O vaga breu. É um insetinho grande, maior do que uma barata que voa. Mas ele possui um dispositivo que suga a luz para ele, como se fosse sua fotossíntese e por ela se alimenta, hora ou outra, o vaga breu chama as fêmeas parando de puxar luz, para que elas saibam que possam com ele, puxar a luz para alimentar os futuros vaga breus.
Queria eu cruzar um vaga breu com um vaga lume, só pra ver o que é que acontece. Um dia, depois de me atentar, tonto, além de janelas e neblinas, dentro das nuvens de tempestades, pude ter um relance do que seria isso.
Choveu. 'Xô ver.
Como uma luz entrando em um buraco negro, eles se encontraram, e, nem dando bola um para o outro, seguiram seu sábio caminho de vagais insetos.

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